É incrível como a indiferença nos magoa tanto. Cresci sempre convosco. Ainda me lembro de andar pela vossa casa descalça no jardim, de saia e t-shirt toda ensopada. Só estava bem no meio da água, a correr que nem uma tolinha. E eram vocês que brincavam comigo, eram vocês que me davam os miminhos e proteção de que precisava. Recordo-me bem que em plena primavera, ainda andava com demasiada roupa e bastante quente. Chegava aí e era a primeira coisa que me faziam: pôr-me apenas com a roupa suficiente para a altura, uma vez que a minha mãe me agasalhava como se eu fosse friorenta e estivesse sempre doente. Eu era elétrica, energética e andava sempre cheia de calor. Tratava-vos pelos diminutivos que tinha adotado quando aprendi a falar. Vocês conheciam-me tão bem. Sempre que vinham a minha casa levavam-me convosco para a vossa. Era a minha maior alegria, eu adorava as tardes que passava aí e todo o carinho que vocês me davam. Eu era a pequenina da casa. Era a única. A menina fofinha, querida e completamente tola da cabeça. Os anos passaram, as coisas foram acontecendo e a minha presença aí era cada vez menos frequente. Os telefonemas não existiam. E as saudades nem se manifestavam. A primeira vez que vos vi e fizeram de conta que não me conheciam doeu, doeu muito. A indiferença começou a dar lugar ao convívio e ao nome "família". Estes tristes episódios começaram a magoar cada vez menos. Mas nunca deixaram de me ser indiferente. Hoje, voltei a ver-vos. Os meus olhos não conseguiam desviar o olhar. Da minha boca não saiu uma única palavra. O meu rosto não mostrou qualquer sorriso. As minhas pernas pararam. E eu fiquei assim, estática, sem saber o que fazer. Os olhares mantinham-se. Eu não conseguia sequer pensar. Até que o meu coração se petrificou. As minhas pernas andaram. E eu segui em frente como se fosse a pessoa mais importante do mundo. Literalmente fugi, admito fugi! Abri a porta e entrei em casa. As minhas pernas começaram a tremer e eu senti o coração muito próximo da boca. Mais uma vez, magoaram-me. Mais uma vez fizeram-me pensar em tudo e recordar os momentos em que era realmente feliz. Mas agora respiro fundo e digo-vos: da próxima não vão conseguir fazer com que o meu corpo fique sem reação. Da próxima faço de conta que nem vejo, nem conheço e nem sinto.
7 comentários:
digo o mesmo a ti acredita!
na maior parte dos casos, somos completamente invisíveis.
grande atitude, querida! adorei este texto, encaixo-me nele. e obrigada, mas mesmo muito obrigada pelo carinho. é bom saber que há quem goste do que escrevo, ainda para mais, quando escrevo tudo o que escrevo com todo o carinho que tenho em mim <3 *
eu acho <3
Tem um óptimo fim-de-semana :D
Beijinhos *
sim, ja o conheco mesmo muito bem e euma sensaçao magnifica *_*
muito obrigada *.*
identifico-me neste texto .
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